Aprendi a cozinhar na marra.
Durante a minha infância e adolescência, lembro qua a minha mãe sempre tinha umas ajudantes na cozinha, embora, ela mesma, fosse uma cozinheira, uma dona de casa de 'mão cheia'. A cozinha - mais dela do que nossa -, era quase um santuário, onde criança não devia circular para não atrapalhar o serviço. De modus que nós, os filhos - somos 5 -, só fomos aprender a cozinhar, a cuidar de uma casa, muito tardiamente, ou seja, quando tivemos de assumir as rédeas dos nossos lares. Desse período, na casa dos meus pais, lembro apenas de saber fazer café (daqueles, com chaleira, bule e coador de pano), chá natural, ovo frito, papa, mingau, vitaminas, ponche. Só.
Aos dezoito, sai de casa para estudar e fui morar em república com várias amigas. Passei mó sufoco. Minha turma cozinhava bem e eu detestava a cozinha, não sabia fazer nem o trivial: nem um arroz, feijão, cuscuz, baião de dois, sopa. Salada, nem pensar. Naquele tempo (nem queiram saber quando foi isso), em casa de nordestino pobre, a salada era somente de folhas de alface, tomate e cebolas em rodelas, com pouco de vinagre por cima ou aquela fomosa, também conhecida por 'maionese' (legumes cozidos com maionese). Hoje, a cozinha nordestina é tão rica e diversificada em salada verdes que a gente já não lembra dos tempos pouco criativos.
Quero frisar bem: a minha comida era péssima. A turma detestava quando era meu dia de cozinhar. Mas, não me importava. Cozinhar não era definitivamente minha prioridade e, frequentemente, tratava de trocar o serviço quando chegava minha vez. Creio que o pessoal também ficava aliviado. rsrs
Quando juntei meus trapos com o maridim, fui morar em Brasília; não tinha mãe por perto para ensinar, nem a turma da república. As secretárias que contratei naquele período também eram péssimas. O único recurso que vislumbrei foram as receitas. Comprava avidamente a revista Claudia Cozinha. Copiava receitas de pratos deliciosos que experimentava em casa de amigos. Procurava testar as mais simples, pouco elaboradas. Aos poucos fui acertando. Uma das primeiras receitas a fazer sucesso de verdade entre os amigos, foi a de Batatas Gratinadas, que consegui localizar entre as propagandas que minha irmã nutricionista recebia. Aliás, na primeira vez fizemos esse prato juntas.
Depois do sucesso das batatas, tomei gosto pela coisa. Fui enveredando pelas massas que eram mais práticas, macarronadas, lasanhas, pizza de liquidificador. Parti para pratos mais pesados como feijoada, pernil, bacalhau, tender. As saladas e molhos já vieram bem numa fase 'pós-graduação'. Tudo conforme os handbooks. Talvez, por isso, tenho o hábito de seguir a receitinha. Às vezes, improviso, invento. Mas, o prazer verdadeiro mesmo, é o da pesquisa, é de pensar na alquimia, na mistura de materiais.
Dá para deduzir que meu aprendizado não foi linear. Pulei aquela etapa da comidinha caseira da mamma, dos pratos da boa lembrança, das iguarias locais da nossa infância. O fato é que hoje ainda não sei fazer um arroz legal, soltinho; tenho de usar o parboilizado dos saquinhos. Não sei fazer um cozido como o da minha mãe, nem uma tapioca, e o meu cuscuz não é lá essas coisas. Mas, dá pra entender? O feijão trivial, é simplório, mas a minha feijoada, modéstia às favas, agrada a gregos e trianos, assim como o vatapá, o bobó...
Gorete, mas eu acho que eh assim mesmo! ninguem nasce sabendo e o prazer de ir descobrindo e melhorando eh o que nos motiva. Cozinha eh experimentacao, acho que pelo menos eh assim que eu vejo. Nem tudo dah certo. mas qdo da, ah que delicia! :-) beijao pra voce!
Posted by: Fer Guimaraes Rosa | 08-09-2006 at 10:59