Obras sobre a formação da culinária brasileira chegam às estantes
POR GRAZIELLA BETING
Pode-se dizer que o primeiro texto sobre hábitos culinários brasileiros é a carta de Pero Vaz de Caminha. Nela, o escrivão da armada de Cabral registra seu espanto com o paladar dos índios, que recusaram a comida oferecida pelos navegadores (como pão, vinho e confeitos): “Não quiseram comer daquilo quase nada; e se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora”. Já nos primeiros dias no país, Caminha observou: “Eles não lavram nem criam. E não comem senão deste inhame, de que aqui há muito”. O “inhame” era na verdade a mandioca, novidade para o português.
Base da alimentação dos índios, a mandioca logo foi incorporada às receitas portuguesas. Essa foi a primeira de uma série de misturas, adaptações e incorporações que a culinária brasileira foi adquirindo ao longo de sua formação. Sucedem-se as receitas africanas dos escravos e os cardápios dos imigrantes europeus. Essa história, que assume características diferentes conforme as regiões do Brasil, é tema que conta, ainda, com pequena bibliografia, mas novas publicações apontam um aumento do interesse em entender a constituição da cozinha nacional.
O livro mais alentado dedicado ao tema é o já clássico História da alimentação no Brasil, de Luís da Câmara Cascudo (Global, 960 págs., R$ 98). Com a primeira edição datada de 1967, é até hoje o mais amplo estudo da formação da cozinha brasileira. Parte da identificação do cardápio indígena, descrevendo técnicas, usos e costumes à mesa, do Brasil colônia ao século XX
Açúcar – uma sociologia do doce, de Gilberto Freyre (Companhia das Letras, 216 págs., esgotado), é outra referência básica. Nesse livro, de 1932, o sociólogo apresenta receitas de tradicionais doces e bolos nordestinos, vistos por ele como um exemplo da mestiçagem brasileira. Para Freyre, a apreciação pelos doces vem de uma herança portuguesa, e as receitas contam com contribuições indígenas e africanas.
Nos festejos dos 500 anos do Brasil, a jornalista Eda Romio escreveu o livro 500 anos de sabor (ER Comunicações, 248 págs., esgotado). É uma interessante reconstituição da história do país por seus pratos típicos. O texto é entremeado por receitas, fotos, provérbios e músicas relacionados à comida.
Em Brasil na rota das especiarias (José Olympio, 174 págs., R$ 30), a pesquisadora Rosa Nepomuceno parte da idéia de que a própria descoberta do Brasil tem a ver com a culinária. Os portugueses deram em nosso litoral na tentativa de encontrar uma rota, mais curta e sem intermediários, até as especiarias do Oriente, e acabaram descobrindo não só o Brasil como um novo mundo de sabores e aromas. Como Nepomuceno relata, no século XIX o Brasil tinha as melhores especiarias do mundo – que foram sumindo das mesas, com o processo de urbanização.
A tese de mestrado da antropóloga Paula Pinto e Silva foi recentemente publicada em livro: Farinha, feijão e carne-seca (Senac São Paulo, 149 págs., R$ 35). Com o subtítulo de “Um tripé culinário no Brasil colonial”, a pesquisa tem como fontes os relatos de viajantes europeus. Pelo ângulo da antropologia, a autora coloca a culinária como fator importante no estudo da cultura de um povo.
Outro lançamento recente é Estrelas no céu da boca (Senac São Paulo, 272 págs., R$ 40). O livro reúne artigos do sociólogo Carlos Alberto Dória que refletem sobre cultura e gastronomia. Na parte dedicada ao Brasil, os escritos abordam de Câmara Cascudo aos restaurantes por quilo.
O badalado chef paulistano Alex Atala é um militante em favor da (re)descoberta dos sabores nacionais. Em Por uma gastronomia brasileira (BEI, 372 págs., R$ 155), resgata o caminho dos alimentos, da lavoura até a mesa, adaptados em receitas sofisticadas.
Outra chef que se lançou numa viagem pelo país foi Ana Luiza Trajano. A expedição resultou no livro Brasil a gosto (edição independente, 172 págs., R$ 80). Não é um livro de receitas, mas dedica-se a mostrar processos artesanais de preparo de alimentos, mercados populares e pequenas propriedades rurais. Ou, como diz Trajano, “a culinária que está fora das panelas”.
Folclore e história estão presentes em Viagem gastronômica através do Brasil (Senac São Paulo, 258 págs., R$ 100). No livro, Caloca Fernandes recupera receitas de várias regiões do país, resgatando o que chama de “gastronomia patrimonial”.
Numa ótima iniciativa de associar turismo e gastronomia, o jornalista Chico Junior oferece, em Roteiros do sabor brasileiro (CJD, 320 págs. R$ 49,50), 16 roteiros de viagem pelo Brasil recheados de informações sobre as principais atrações culturais e culinárias. Da cidade ao sertão, do litoral à floresta.
Ilustração: Escravas no Rio, por Rugendas; relato dos viajantes ajuda a reconstituir cardápio do Brasil colonial.
Via: EntreLivros
Tem sempre posts muito interessantes, querida Gorete. :-)
Beijinhos de Portugal.
Posted by: Elvira | 09-11-2006 at 09:47
se nao saber di nada
Posted by: | 05-05-2008 at 16:26