Aqui e acolá, neste blog, tenho manifestado admiração e apego aos hábitos alimentares interioranos, antigos, aqueles de raiz, que conhecemos e nos fazem lembrar das nossas mesas de família, e que têm sido normalmente herdados dos nossos pais e avós.
Um exemplo bem típico de pratos que herdamos dos nossos antepassados é a galinha de capoeira, ou galinha caipira, de cabidela ou ao molho pardo, um prato ainda obrigatório nas mesas nordestinas. Aos domingos, em ocasiões especiais ou de festa, ela sempre reinou absoluta. Em dias de festa, não podia faltar a indefectível galinha e seus inseparáveis acompanhamentos - farofa, arroz branco, macarrão refogado na manteiga.
Atenção: a galinha caipira - com ou sem cabidela - não tem sido muito apreciada pelas gerações bem jovens. Pergunte-lhes sobre sua preferência entre este prato tradicional e a moderna pizza, por exemplo. Meu filho, meus sobrinhos e a maior parte dos amigos apenas suportam a galinha, mas não resistem a um rodízio de pizza; enquanto Elias e eu, na disponibilidade dos dois pratos, não ousamos trocar a nossa galinha de cabidela por uma pizza.
Há algum tempo eu vinha pensando escrever algo sobre esse prato que é minha melhor lembrança, mas, eis que hoje, providencialmente, Lecticia Cavalcanti reabilita a sua majestade, resgatando-a das entranhas da nossa história. Vale a pena saber como a galinha entrou definitivamente no nosso cardápio. O curioso é que, antes de 1500, os índios não conheciam a galinha e os escravos não a apreciavam. A galinha, comida de alguns brancos privilegiados, foi importada pelos portugueses, mas as origens mais remotas da cabidela são francesas, do poulet en barbouille, nas batalhas entre César e os gauleses.
Aproveito também para transcrever a receita proposta por Lectícia:
GALINHA DE CABIDELA
Ingredientes:
1 galinha (de capoeira) grande e gorda
2 colheres de sopa de vinagre
4 limões
Sal, pimenta do reino e cheiro verde a gosto
2 dentes de alho socados
1 cebola ralada
2 colheres de sopa de óleo
½ pimentão cortado em tiras finas
4 tomates picados (sem pele e sem sementes)
2 colheres de sobremesa de extrato de tomate
2 folhas de louro
Preparo:
- Junte o sangue da galinha em recipiente com vinagre. Bata com um garfo, para não talhar. Reserve.
- Corte a galinha em pedaços. Passe limão. Lave e tempere com sal, pimenta e alho. Reserve.
- Leve ao fogo uma panela grande, com óleo. Doure a galinha. Junte cebola, cheiro verde, extrato de tomate, louro, pimentão, tomate. Refogue tudo em fogo brando. Acrescente água. Deixe no fogo até que a galinha esteja bem macia.
- Na hora de servir, junte o sangue (mexa antes) aos poucos, na panela. Leve novamente ao fogo e misture bem. Deixe até que tudo esteja bem cozido.
- Sirva com batata cozida e arroz branco.
Aqui em casa, utilizamos apenas temperos secos, cebola, cebolinha, cheiro verde, alho, que guardam a autenticidade da substância da galinha tradicional. Não usamos tomate (in natura ou industrializado), louro ou pimentão. O colorau também é um ingrediente largamente usado de um modo geral nas galinhas nordestinas.
Foto da versão francesa da Cabidela, com vinho tinto e champignon: poulet en barbouille - Terra Magazine e Ms. Glaze's Pommes d'Amour.
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