Walt Whitman, em 1887
De Folhas de Relva
Walt Whitman
Trad. de Geir Campos
Creio em você minha alma:
o outro que sou não deve
rebaixar-se a você,
nem você deve rebaixar-se
ao outro.
Folgue comigo na grama,
afrouxe o nó da garganta,
nem palavras, nem música, nem rimas,
estou querendo,
nem costume, nem lições,
por melhor que seja:
eu gosto é do acalanto
do murmúrio valvar da tua voz.
Lembro como uma vez nos espichamos
numa certa manhã de verão transparente,
como forçaste a cabeça nos meus quadris
e me rasgaste a camisa no osso do peito
e enfiaste a língua em meu coração nu
e foste assim até tocar-me a barba
e foste assim até tocar-me os pés.
Docemente cresceu e se espalhou
em torno a mim a minha paz-sabedoria
além de todo argumento da terra,
eu sei que a mão de Deus
é promessa da minha,
eu sei que o espírito de Deus
é irmão do meu,
e que todos os homens já nascidos
são também meus irmãos
- e as mulheres, irmãs e amantes minhas –
e que o esteio da criação é o amor
e ilimitadas são as folhas secas
ou caídas nos campos,
e as formigas castanhas
nos buraquinhos por debaixo delas,
e as cicatrizes dos líquens
nos mourões tortos da cerca,
pilhas de pedras, flores
silvestres, musgo e espinhos.
"Walt Whitman (1819- 1892) é tido como o poeta norte-americano mais importante da segunda metade do século XIX; muitos também o consideram, quase com unanimidade, um dos maiores da literatura mundial. Uma tradução brasileira integral da edição de 1855, a ser lançada no fim deste mês para coincidir com o aniversário do livro, deverá dar ao leitor uma idéia de sua grandiosidade".
(Conteúdo extraído da revista EntreLivros, Edição nº6 - Outubro/2005)