Foto: Portugal através do Mundo.
A dramaturgia televisiva nacional não é a mesma de décadas atrás. Faço uma ressalva apenas às abordagens social e tecnológica que são mais fortes e mais exploradas nas novelas atuais
Quem assistiu à "Rosa Rebelde" (1969), "Redenção" (1966-68), " A legião dos esquecidos" (1968), "Passo dos Ventos" (1968-69), "Nino, o Italianinho" (1969-70), "O Bem Amado" (1973), Irmãos Coragem" (1970), "O cafona"(1971), Beto Rockfeller" (1968-69), "Ossos do barão", "Pecado capital", "Roque Santeiro", sabe que não se fazem mais novelas tão boas como antes. Nem os remakes das clássicas conseguem sensibilizar mais do que as versões originais.
Essa reflexão vem no rastro da notícia de mortes do ator John Herbert e de Geórgia Gomide, atriz que atuou alguns meses na primeira adaptação para novela d"As Pupilas do Senhor Reitor" (1971) na TV Record, escrita por Lauro César Muniz, baseada no homônimo romance de Júlio Diniz. Infelizmente, aos poucos, vão-se os ícones dessa época de ouro.
Geórgia fez brilhantemente o papel de Clara, uma das duas pupilas (Clara e Margarida), personagens centrais na trama do romance português. Ela deixou a novela e foi substituída pala atriz Maria Estela que não chegou a alcançar o seu brilho. Geórgia imprimiu à personagem Clara uma presença forte e carismática, uma alegria marcante; era linda, e atraía para si toda simpatia do público.
Uma avalanche de lembranças irrompem ante à constatação de que novelas escritas - destacadamente - por Janete Clair e Dias Gomes, se valiam à pena assistir, porque, além de se tratarem realmente de obras literárias, a sua eficiente transposição para tv dava-se muito mais pelo genuíno talento de seus atores.
Comparadas às dos dias de hoje, as novelas faziam sucesso baseadas em textos de qualidade literária e na formação e dinamismo do seu elenco, não obstante as restrições e cortes que eram impostos pelo regime de ditadura e os parcos recursos tecnológicos disponíveis à época. A tv ainda vivia a era P&B, o elenco era sempre formado por 'atores' (não havia invasão de modelos aspirantes a atores), e o domínio de merchandise [ops, merchandising] se verificava apenas em leves intervalos comerciais. Por que será que a tv atual, mesmo já tendo superado essas vicissitudes, não consegue (com raras exceções) fazer coisa melhor, nem quando tentar reinterpretar os textos que outrora arrancaram tantos suspiros?
Lembro que a exibição das novelas paralisava os horários domésticos. Havia uma fidelidade generalizada à 'hora da novela' em todas as famílias. As discussões sobre seus suspenses, suas tramas, dominavam as rodas de conversas nas casas, nas ruas, no trabalho, nas escolas.
Lembro que, na década de sessenta, nem todas as residências no nordeste possuíam tv, mas já se registrava a existência do 'televizinho', uma modalidade de rede social que se estabeleceu em todos os recantos. Quem tinha tv não escapava do assédio dos 'sem tv', porque, simplesmente, as novelas eram irresistíveis!