A revista britânica The Economist, divulgou em reportagem de 22 de março que o Brasil é chamado de "nação de não-leitores". O periódico baseou-se no levantamento em que o Brasil figura como 27º (em 30) em assiduidade de leitura. A autoria do estudo não foi mencionada, mas demonstra que o brasileiro dedica, em média, 5,2 horas semanais aos livros.
A revista alega que os altos preços cobrados pelos livros contribuem para o desapego à leitura. Acrescenta que a negligência governamental com a educação, estaria na origem do que descreve como "indiferença aos livros", e que remonta aos tempos da escravidão.
Diz, ainda, a revista, que o problema teria sido agravado pela universalização tardia (nos anos 90) do primário, apesar de iniciativas como o Plano Nacional do Livro e Leitura para remediar o déficit. E que, um indício disso, é que a venda de livros no Brasil foi menor em 2004 do que em 1991. Isso motivou o pedido de demissão do presidente da Biblioteca Nacional, Pedro Corrêa do Lago, que reclamou que teve apenas metade dos bibliotecários de que precisava e que traças destruíram grande parte do acervo em 2005. "A deterioração do acervo por traças é tratada pela revista como motivo para ‘vergonha nacional’ ".
Tenho muito orgulho de ser brasileira, mas por esta e outras, muitas vezes, sinto vergonha dessa condição. Apesar de repudiar o tom ofensivo da publicação, devemos reconhecer que o resultado do estudo retrata a nossa mais pura realidade. As nossas escolas e bibliotecas estão realmente maltratadas e esquecidas das políticas públicas.
Dos anos 2000 a 2002, participei intensamente da mobilização nacional, promovida pelo Programa Sociedade da Informação, do Ministério da C&T, que visava incorporar de forma ampla e definitiva as bibliotecas brasileiras na sociedade da informação, ou seja, "responder ao desafio de inclusão social de toda população no Brasil, principiando com a inclusão social digital."
Como resultado desse esforço, foram apresentadas cerca de 12 mil bibliotecas candidatas do setor público e do 3º setor aos benefícios do FUST. O Fundo foi criado para ampliar os serviços de telecomunicações no Brasil, principalmente nas regiões mais distantes, implantando redes de comunicação em escolas, órgãos públicos, bibliotecas e instituições de saúde, melhorando o atendimento à população. Os recursos do FUST provêm do recolhimento de 1% do faturamento bruto das empresas do setor (excluído o ICMS, PIS e Cofins), 1% do que cada um de nós pagamos em nossas contas telefônicas, e que já tinha, até dezembro do ano passado, arrecadado cerca de 4 bilhões de reais.
Todavia, sabemos que os 90% dos recursos arrecadados foram contingenciados pelo Governo Federal, enquanto os restantes 10% permanecem em programas de educação e saúde, mas praticamente intocados. O que se sabe pela Internet é que a sua aplicação esbarra em ações na Justiça - promovidas pelas operadoras de telecomunicações -, em movimentos populares e em denúncias veiculadas na imprensa. Falam-se em irregularidades nas licitações e nos projetos que envolvem esses recursos. E o que é pior: "os R$ 4 bilhões do Fust não podem mais ser usados pelas telecomunicações. Tudo que se acumulou em cinco anos pode ter ido pelo ralo."
Em 2004 foi criado o Projeto Casa Brasil para implantar equipamentos públicos com diversos módulos em que se realizam atividades em torno dos temas "Inclusão Digital e Sociedade da Informação". Na ocasião, o Secretário-Executivo do Ministério das Comunicações (MC), admitiu que as verbas do FUST poderiam ser utilizadas no programa no futuro. Mas, no portal do Casa Brasil, não vimos qualquer indício de relacionamento com o FUST.
Consta na matéria veiculada pelo Observatório da Imprensa, em dezembro de 2005, que "o TCU fixou um prazo máximo de 180 dias para que o MC apresente diagnóstico da necessidade de universalização de telecomunicações no Brasil, de acordo com os objetivos previstos pela Lei do FUST, e aponte políticas, diretrizes e prioridades para sua aplicação, indicando os programas governamentais que receberão os recursos. Determinou à Anatel que, com a orientação do Ministério, implemente as ações regulatórias necessárias para viabilizar a aplicação do FUST." E que "em até 30 dias, o Ministério deverá apresentar ao Tribunal o cronograma de execução dessas ações. Também proferiu recomendações à Casa Civil da Presidência da República, para que desempenhe um papel mais ativo nesse processo, principalmente no que se refere à integração e coordenação de políticas governamentais de inclusão digital e na avaliação e implementação de medidas que aperfeiçoem a atuação do MC."
O que nos envergonha realmente, é que, enquanto se prolongam a irresponsabilidade, a negligência, o disse-me-disse, as nossas escolas afundam-se no atraso, as nossas bibliotecas vão sendo carcomidas pelas traças e a nossa fama de brasileiros alienados vai-se disseminando progressivamente pelo mundo afora.
Leia mais:
Rede Pitágoras: Brasil é nação de “não-leitores", diz revista inglesa .
Projeto Software Livre Bahia: FUST JÁ!! Peça ao Ministro Hélio Costa a liberação imediata dos recursos do FUST.
FUST: melhores dias virão?.
UniSESI: Compasso de espera: Governo federal segura R$ 3,4 bilhões de fundo para inclusão digital e retarda investimentos em escolas e bibliotecas.
Observatório da Imprensa: IN(EX)CLUSÃO DIGITAL: por que o governo não aplicou os recursos do Fust? .
Folha Online/Dinheiro: Governo irá usar Fust para instalar telefones em 100 mil escolas.
O Estado de São Paulo: $ 4 bilhões do Fust já foram pelo ralo.
PNLL: Plano Nacional do Livro e Leitura quer ampliar índice de leitura em 50% até 2008.
Foto: Gettyimages, Alberto Ruggieri.