Pensavam que eu tinha sumido do mapa?
Não, definitivamente, hem. Uma house-wife que se preza não abandona o barco, assim, inopinadamente.
Continuo na azáfama. Muitos livros, leituras, escritas, cansaço, noites mal-dormidas. Além da tese, também estou estou ministrando um curso de gestão da inovação tecnológica para uma empresa transnacional, que é a primeira no mundo em seu segmento. Então, a responsabilidade é grande. E, por isso, as ausências eventuais aqui e alhures.
Relaciono o tema dos estudos e do trabalho aos meus experimentos domésticos: de nada vai adiantar a teoria, por mais fundamentada e estabelecida, se a prática não funcionar e não fizer diferença para o meu público-alvo. Uma boa idéia é, realmente, fundamental. Mas, se em sua implementação, por algum motivo, não surge algo novo, diferente, palatável, atraente, não é inovação - é, simplesmente, criatividade. Inovação vem a ser a demonstração/prova da implementação de uma boa idéia que foi assimilada, degustada, absorvida, aprovada, comprada, apropriada.
Essa analogia, tiro da linha de produção da minha própria cozinha, confiando num princípio básico, contido nas palavras de Chico Xavier, que dizia: "Somente aquele que sabe fazer as coisas pequeninas, virá a saber e a poder realizar grandes coisas". Sim, no mais das vezes, uma grande idéia está em pequenos detalhes operacionais, não é mesmo?
Valho-me da concepção de que a base do meu receituário pode ser a mesma, mas que, a partir dela, eu posso reinventá-lo a cada dia. Na cozinha, não estamos habituada(o)s a questionar por que as receitas são como são. Padecemos do continuísmo mental, que nos dificulta a percepção da oportunidade de melhorar um cardápio, um prato ou o processo de fazê-lo. Pode ser por preguiça de aprimorá-lo(s); ou por desatenção às sequências, aos procedimentos - será que não poderiam ser de outra(s) forma(s), utilizando outros instrumentos, cores e formatos? -; dependência das condições materiais e ambientais da nossa home (por que abortar uma idéia cuja implementação é cara? por que não podemos reduzir o seu custo? Há tantas maneiras...). A complacência também é um pecado grave nos nossos princípios familiares. Acontece quando nos submetemos a uma iguaria que é de tradição familiar, apreciadíssima por todos os agregados e se transforma na "receita intocável". Por que não questioná-la? Desconstruí-la? Ressignificá-la no contexto das novas gerações, das crianças, dos adolescentes, da terceira idade?... No interior do nordeste é usualíssimo a presença da galinha caipira, ou ao molho pardo, nas mesas aos domingos. Os nossos pais adoooram de modo irredutível, mas os jovens abominam, preferem pratos mais "modernos".
De uma visão extraída a partir dos meus estudos e trabalhos, e reconhecendo a falência de velhos paradigmas, quando quero fazer algo novo, sempre olho para minha cozinha - que é muito simples, por sinal - perguntando: onde está a preguiça?... E a seqüência, a dependência, a complacência?... E se...? Por que isso é como é...? Dá para fazer diferente?... Por que não?...
É claro que a possibilidade de resultar num incêndio, numa gororoba, numa arenga familiar, existe. Mas, um pensamento trivial já dizia que quem não se arrisca não petisca. Isso vale, inclusive, para a cozinha. No trabalho, também acredito em velhas receitas para empresas do futuro. Na culinária, por exemplo, vejo uma diferença fundamental entre fazer um prato bem feito e o fazer criativo. Um prato bem feito pode decorrer tanto do prazer quanto da recompensa; mas, fazê-lo de forma criativa é domínio único e exclusivo de quem faz por prazer.